O vilanovense e seu nocivo sebastianismo
Em 1578 o rei de Portugal D. Sebastião desapareceu em uma batalha. Seu corpo nunca foi encontrado, então a população lusa esperou religiosamente seu retorno. Tal retorno viria junto com o fim de todos os problemas do reino. Essa crença no retorno de algo milagroso que irá sanar todos os problemas ficou conhecida como Sebastianismo. É tão comum no Brasil que atingiu até o futebol. Na verdade, não sei se permeia todo o futebol, mas é comum em um clube de futebol: o Vila Nova Futebol Clube.
Em momentos como o atual é bastante comum, como um parasita oportunista que espera a imunidade do corpo abaixar para sair do estado de letargia. Como uma herpes. Não tão incômodo, mas definitivamente mais prejudicial. O time sofre sucessivos fracassos e começa a busca por um culpado. Por algum motivo, a torcida do Vila frequentemente culpa o elenco, o técnico e toda a diretoria. Deve-se demitir 90% dos jogadores, o técnico, o presidente e o diretor de futebol. Um dia virá um grupo milagroso de diretores, jogadores e técnicos que irão levar o time à elite do futebol.
Até lá, deve-se manter o lugar vago, para que apenas esse Sebastião coletivo possa ocupa-lo. Esse raciocínio é extremamente falho e nocivo. Não estou teorizando ou inventando a roda aqui: em 2009, apenas 2 jogadores do time de 2008 foram mantidos. O resultado: o time ficou em décimo terceiro lugar na série B, sendo que em 2008 ficou em sexto. Demorou 9 anos para disputar o acesso novamente. Já na conquista do tetra-campeonato goiano, um dos maiores feitos do clube, durante 4 anos 6 jogadores foram mantidos. Desde 2015, há um esforço para manter o elenco. É essencial. O Vila não tem recursos para a cada derrota contratar jogadores e técnicos de qualidade. Deve-se trabalhar dentro das limitações do clube. Se é que elas são tão grandes quanto dizem.
O técnico Hemerson Maria é o mais injustiçado dessas críticas. Não por ser perfeito, mas por ser completamente subestimado. Em 2017 o time do Vila tinha uma das menores folhas salariais do campeonato e ficou em sexto. Tinha sim jogadores bons, mas estava longe de ser o melhor elenco da competição. Hemerson praticamente tirou leite de pedra. Poderíamos até ter chegado mais longe. O fracasso no acesso com certeza não foi culpa dele. No jogo contra o Joinville, na virada histórica deste ano, suas alterações renderam uma assistência e um gol. No jogo contra a Aparecidense foi questionado por… colocar um zagueiro no lugar de um atacante…
Essa alteração, embora depois do resultado tenha se mostrado ineficaz, não é tão absurda. A falha no gol sequer foi do zagueiro que entrou. Muito se acusa a diretoria. Supostamente esta estaria lucrando em cima do Vila. Não me parece possível, sendo que o time está gastando com contratações nada baratas e não tem um elenco tão barato. Tudo indica que não há muita folga no ganho mensal do Vila, pelo ou menos não o suficiente para estar dando lucros expressivos para mais de uma pessoa. A cobrança por transparência deve ser feita, mas deve haver uma presunção de inocência. Afinal, não vejo muitas pessoas empenhadas a dedicar sua vida ao Vila. Aliás, historicamente esta atividade nunca foi lucrativa. Em 1984 o Vila tinha 32 credores e a solução foi dividir a renda dos jogos em 32 partes. O clube então precisava montar uma equipe para disputar o título sem renda nenhuma. A solução foi o presidente e outros membros pagarem com o dinheiro do próprio bolso.
O presidente da época, Alaor Gonzaga, no fim de seu mandato, fez vistas grossas aos 110 milhões de cruzeiros que emprestou ao clube. Mesmo na panela de pressão, foi campeão goiano. Já em 1966 a rotatividade de presidentes (como sonha iludidos torcedores) foi tão grande que dentro de um ano houveram cinco presidentes, com o padeiro Ronaldo Alves Macedo assumindo a presidência e só 3 anos depois o clube tornou a conquistar algo. Além de não ser lucrativo, a presidência do Vila nunca foi saudável para o time a curto prazo. É preciso ter paciência.