Dalai Rocha comenta exclusão de conselheiros: “atos mais difíceis de serem assinados”

O presidente interino do Cruzeiro e presidente do Conselho Deliberativo José Dalai Rocha assinou o parecer do Conselho de Ética e Disciplina do clube oficializando a exclusão de 29 conselheiros do Cruzeiro. Medida foi tomada com base no Estatuto, pois eles haviam ocupado cargos remunerados no clube, o que é passível de exclusão. Em artigo, Dalai Rocha explicou a decisão.

Entre os 29 excluídos, dois nomes chamam a atenção: Gustavo Perrella, filho do ex-presidente do Cruzeiro Zezé Perrella, e Sérgio Nonato, diretor na gestão Wagner Pires de Sá que renunciou no fim de 2019 após o rebaixamento do Cruzeiro para a Série B do Campeonato Brasileiro.

A explicação para a exclusão dos 29 conselheiros foi dada em artigo publicado primeiramente pelo portal Superesportes. Nele, Dalai Rocha afirma que foi uma das decisões mais difíceis na liderança do Cruzeiro.

“Assinei, no fim de semana, os atos mais difíceis de serem assinados, desde que assumi a presidência do Cruzeiro. Tratava-se de excluir dos quadros de Conselheiros e Natos todos aqueles que infringiram a expressa proibição contida no parágrafo terceiro do art. 18 do nosso Estatuto.”

O parágrafo citado pelo presidente interino do Cruzeiro fala claramente que o conselheiro contratado como empregado perderá o mandato: “o Associado Conselheiro Nato e Associado Conselheiro, contratado como empregado do Clube, perde o mandato e o suplente de Conselheiro será excluído do quadro de suplência”.

O Cruzeiro teve mudança no Estatuto em 21 de outubro de 2015, no segundo mandato de Gilvan Pinho Tavares em Assembleia Geral com os conselheiros. Porém, explicou Dalai, “Como a Lei só retroage para beneficiar, nunca para punir, foram mantidos nos cargos remunerados Conselheiros que lá estavam antes do novo Estatuto, como Nelio Lopes, Aristoteles de Paula Loredo (Tote), Fernando de Souza, Ercilio Silva Ferreira e outros”.

Gilvan de Pinho Tavares encerrou seu mandato em 2017 e Wagner Pires comandou o Cruzeiro por quase dois anos antes da renúncia no fim de 2019. Ele ignorou a proibição do Estatuto e entendeu que poderia remunerar o conselheiro desde que fosse como pessoa jurídica (CNPJ).

12/01/2017 - Coletiva Presidente Gilvan de Pinho Tavares - YouTube
Gilvan de Pinho Tavares presidiu o Cruzeiro por seis anos, de 2011 até 2017 (Reprodução/Cruzeiro)

No entanto, alguns desses que já estavam como empregados foram demitidos e contratados novamente por Wagner. Assim, sendo após a mudança de Estatuto, a situação era passível de exclusão. Ao todo, 32 conselheiros estavam nesta situação, mas três foram liberados.

“Assim, cerca de 30 mantiveram-se na situação conflitante, vedada pelo Estatuto, afinal definida pelo Conselho de Ética e Disciplina, depois de ouvir cada um dos envolvidos. Em consequência, lavraram-se os atos de desligamento, agora assinados.” disse Dalai Rocha em artigo.

A lista assinada por José Dalai Rocha tinha 29 nomes, alguns de famílias influentes no Cruzeiro como o filho do ex-presidente Zezé Perrella, Gustavo Perrella, Sérgio Nonato, Wilmer Zaratini Mendes, filho do ex-presidente do Conselho, Wilmer Santa Luzia.

Gestão Wagner PIres ignorou proibição do estatuto (Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)

“Dentre os que se encontravam nessa situação, um filho de ex-presidente do Cruzeiro, servidores admirados e vários amigos-irmãos. É exatamente o inegável prestigio de muitos deles e o estreito relacionamento com dirigentes, que vinham retardando a decisão final, provocando justas críticas de quem luta pela reconstrução do clube”, analisou Dalai.

“Alguém perto de mim, quando das assinaturas, perguntou porque não excluía os atos “mais polêmicos”, para evitar ‘reação de gente poderosa’. Ou assino todos, ou não assino nenhum, respondi enquanto concluía a dolorosa tarefa que me expõe agora à pancadaria de ‘amigos’”, completou.

De acordo com informações do Superesportes, outros membros da Mesa Diretora do Conselho Deliberativo têm de assinar o documento. Fazem parte do grupo Paulo Sifuentes e o 1º secretário Waldeyr de Paula. Outros ainda defendem a tese de que a maioria do Conselho Deliberativo teria de aceitar as exclusões em votação. A situação tende à judicialização.

Leia a íntegra do artigo de José Dalai Rocha publicado no Superesportes:

A LEI É PARA TODOS?

Assinei, no fim de semana, os atos mais difíceis de serem assinados, desde que assumi a presidência do Cruzeiro. 

Tratava-se de excluir dos quadros de Conselheiros e Natos todos aqueles que infringiram a expressa proibição contida no parágrafo terceiro do art. 18 do nosso Estatuto.

Está redigido assim:O Associado Conselheiro Nato e Associado Conselheiro, contratado como empregado do Clube, perde o mandato e o suplente de Conselheiro será excluído do quadro de suplência.

De notar-se que o parágrafo não diz “pode perder”, ou “poderá perder”, ou “sujeita-se à perda”. A norma é cogente. Auto aplicável. Impositiva: PERDE O MANDATO!

Desde o dia 21 de outubro de 2015, quando em Assembléia Geral este novo Estatuto foi aprovado, varias situações ocorreram em que Conselheiros optaram: perda do mandato, para assumir função remunerada, ou abdicando do salário para manter o status de Conselheiro.

Na administração Gilvan Pinho Tavares a norma foi rigorosamente observada. Como a Lei só retroage para beneficiar, nunca para punir, foram mantidos nos cargos remunerados Conselheiros que lá estavam antes do novo Estatuto, como Nelio Lopes, Aristoteles de Paula Loredo (Tote), Fernando de Souza, Ercilio Silva Ferreira e outros.

Então Primeiro Secretário do Conselho Deliberativo, na época, rechacei com firmeza todas as muitas tentativas chegadas a mim por aqueles que visavam afastar esses conselheiros, sempre explicando que as novas normas estatutárias não os atingiam

.A administração Wagner Pires, que veio em seguida, sistematicamente ignorou essa proibição estatutária, sob o equivocado entendimento de que poderia, sim, remunerar o Conselheiro como pessoa jurídica (CNPJ). Inúmeras alertas e notificações foram feitas pelo Conselho Deliberativo, na presidência de Zezé Perrela, para que o Conselheiro optasse entre manter-se no cargo remunerado, perdendo o mandato, ou vice-versa. Poucos atenderam, compreendendo o rigor do Estatuto quanto a esta questão. Nomeado assessor remunerado por Zezé Perrela, Rogerio Nunes (Rogerinho) imediatamente abriu mão do mandato de conselheiro.

Conselheiros, antigos ocupantes de cargos remunerados, demitidos por Wagner Pires, e posteriormente readmitidos, passaram obviamente a ser alcançados pela proibição estatutária mas resolveram correr o risco.

Assim, cerca de 30 mantiveram-se na situação conflitante, vedada pelo Estatuto, afinal definida pelo Conselho de Ética e Disciplina, depois de ouvir cada um dos envolvidos. Em consequência, lavraram-se os atos de desligamento, agora assinados.

Dentre os que se encontravam nessa situação, um filho de ex-presidente do Cruzeiro, servidores admirados e vários amigos-irmãos. É exatamente o inegável prestigio de muitos deles e o estreito relacionamento com dirigentes, que vinham retardando a decisão final, provocando justas críticas de quem luta pela reconstrução do Clube.

Com os atos colocados à minha frente, para assinar, tive a percepção do quanto iria magoar amigos, “decepcionar” aqueles que acreditam serem as leis apenas para alguns, não para todos; ser acusado de “ingrato” pelos que, tendo me apoiado ou ajudado em alguma ocasião, julgaram-se licenciados para descumprir as disposições estatutárias, sem risco de punição. Para esses, obviamente, a lei só se aplica aos que estão fora do nosso círculo fechado de amigos. Ou contra aqueles que não têm poder de reação. Jamais contra poderosos.

Nunca soube viver assim. Juiz em Comarcas do interior e tendo dois filhos jovens, candidatos potenciais a farras e confusões, convidava o delegado de policia para um café na minha casa, apresentava os filhos e pedia um favor: em qualquer ocorrência que tivessem envolvidos, e se houvesse prisão, que fossem os primeiros a serem presos e os últimos a serem soltos. Nunca tive problemas com eles que cresceram cultivando valores inafastáveis de ética, de justiça, de respeito ao próximo, abominando privilégios e nepotismos.

Alguém perto de mim, quando das assinaturas, perguntou porque não excluía os atos “mais polêmicos”, para evitar “reação de gente poderosa”.

– Ou assino todos, ou não assino nenhum, respondi enquanto concluía a dolorosa tarefa que me expõe agora à pancadaria de “amigos”.

José Dalai Rocha

Presidente interino do Cruzeiro Esporte Clube

Foto de capa: Vinnicius Silva