Flamengo

Assustador: os meninos viraram números e estatísticas

No início da noite deste sábado, o Flamengo concedeu um esclarecimento sobre as indenizações às famílias que tiveram seus entes queridos vitimados na tragédia do Ninho do Urubu, no dia 8 de fevereiro de 2019.

O esclarecimento foi feito através do YouTube oficial clube, a FLATV. Apresentado por Luana Trindade, que leu perguntas enviadas por jornalistas, que foram respondidas pelo presidente Rodolfo Landim, o VP geral e jurídico Rodrigo Dunshee de Abranches, e o CEO do clube, Reinaldo Belotti.

Abaixo, acompanhe alguns trechos do esclarecimento:

Fla TV: O Flamengo conseguiu na Justiça o alvará do Ninho do Urubu. Todas as questões levantadas pelo Ministério Público e pelos órgãos de fiscalização foram atendidas?

Rodrigo Dunshee – A gente tinha duas vertentes principais nessa questão: documentação e envolvendo a Vara da Infância e do Adolescente. Na questão de documentação, envolvia Corpo de Bombeiros e Prefeitura. Elas foram sanadas. O Flamengo tem o alvará e toda a documentação OK hoje em dia. Com relação à Vara da Infância e do Adolescente, fizemos com o MP um TAC (termo de ajustamento de conduta) prevendo medidas de segurança, educação, saúde e acompanhamento psicológico. Basicamente tudo o que o Flamengo já tinha, com algum aprimoramento sugerido pelo MP. Esse TAC tem acompanhamento anual, mas pode ser inferior. Isso será perene. Por trabalhar com menores de 18 anos, o Flamengo sempre terá um acompanhamento. Como tinha. Mas foi importante ter esse procedimento padrão para saber todo o necessário. O juiz homologou e está tudo certo.

Reinaldo Belotti – Nós não conseguimos o alvará na Justiça. Conseguimos o alvará seguindo todos os procedimentos necessários para ter o alvará. Além do alvará, conseguimos o habite-se. Hoje, o Ninho tem o alvará e o habite-se dando pelos órgãos competentes seguindo tudo o que era necessário. Tivemos aqui muito mais do que MP e prefeitura fazendo verificações internas. Por exemplo, a Vigilância Sanitária esteve aqui, e nós passamos com louvor, sem nenhum tipo de observação. Então, como o Rodrigo disse, o TAC está sendo totalmente cumprido. Apesar de ter uma inspeção ou semestral ou anula, depende do que o MP quer, mensalmente a gente faz essa verificação interna de modo que a gente garanta que tudo esteja sendo cumprido.

Rodolfo Landim – Nesse aspecto, de segurança, a gente fez uma reestruturação dentro do clube focando na segurança, colocando profissionais para cuidar disso e, na verdade, a revisão foi feita nos procedimentos de trabalho. Em todas as pessoas que trabalham não só aqui, mas também na Gávea, onde nós conseguimos também novas licenças que o clube nunca tinha obtido para vigorar a partir de agora.

Fla TV: O Flamengo afastou alguém que tenha prestado depoimento ou tenha sido questionado sobre o incêndio?

Rodolfo Landim – De forma nenhuma. Não por isso. Pelo contrário. Encaramos o acidente como oportunidade de melhoraria. Então, a gente queria identifcar as causas para eliminá-las para que isso nunca mais pudesse acontecer. Esse sempre foi a nossa grande preocupação.

Rodrigo Dunshee – É importante ressaltar que o Flamengo, embora esteja aprimorando os seus processos, nesse caso, se coloca à disposição de todos os envolvidos e todas as famílias, reconhece que tem responsabilidade independentemente de culpa. Para nós, de tudo que a gente olhou, nos aparenta ter sido um lamentável acidente. Mas nós temos responsabilidade como guardiões daqueles adolescentes e é por isso que estamos à disposição das famílias.

Fla TV: O inquérito ainda não foi concluído. Isso incomoda? Cobram agilidade nas investigações?

Rodrigo Dunshee – Essa pergunta precisa ser esclarecida. Inicialmente, a autoridade policial atuou, me parece, com muita celeridade. Foi encaminhado ao MP, que solicitou nos esclarecimentos. Ou seja, voltou para a autoridade policial para que algumas dúvidas do MP fossem esclarecidas. É comum isso acontecer. Então, não é que esteja demorando. Eles estão se esforçando para chegar a alguma conclusão e, por vezes, o MP consulta a polícia sobre novas perguntas. A gente acha que está chegando ao fim e a gente não cobra nada pois sabe que está sendo feito com zelo e atenção.

Fla TV: Vocês fizeram quatro acordos pontuais. Como andam os outros seis acordos?

Rodrigo Dunshee – Nós fizemos quatro acordos, mas além disso fizemos outros 20 acordos com os sobreviventes e com os que se lesionaram. O Flamengo desde o acidente espontaneamente começou a pagar R$ 5 mil para cada família, para que essas famílias pudessem ter tranquilidade de negociar um acordo com o Flamengo sem ter necessidade emergencial de caixa. Os garotos em média recebiam R$ 800 por mês, e o Flamengo pagou mais de seis vezes, espontaneamente, o que pagava aos meninos. O Flamengo o tempo inteiro se colocou à disposição das famílias. No quesito acordo, o Flamengo, depois de muita conversa, chegou a um valor que entendemos ser muito alto e muito acima dos precedentes da Justiça brasileira. Esse valor não levou em consideração quesitos como a estatística de que esses meninos dificilmente percentualmente chegariam a ser titulares do Flamengo. Esse valor que nós oferecemos, três famílias e meia aceitaram. Não podemos tratar a tragédia de uma forma para uma família e de outra forma para outra família. No nosso valor oferecido, que nós consideramos satisfatório, e três famílias e meia também consideraram, é a nossa oferta. A gente tem um limite, a gente tem tentado pegar esse valor e transformar de uma forma que atenda às famílias restantes. O Flamengo está aberto a negociação, as famílias também parecem estar, porque só meia família entrou na Justiça, a mãe do Rykelmo entrou na Justiça carioca pedindo uma indenização. O pai fez acordo com o Flamengo, a mãe entrou na Justiça. São separados, ele entendeu que o valor que o Flamengo oferecia era capaz de resolver a situação para ele, ele recebeu, e ela foi à Justiça. É um direito individual de cada um. Ele tem a dor dele, ela tem a dor dela. Cada um vai resolver de um jeito diferente. Normalmente a gente tem negociado com a família inteira, mas podemos separar também. Estamos tentando continuar conversando com as outras famílias, nós temos contato com os advogados das famílias, estamos otimistas que isso possa resultar num acordo.

Rodolfo Landim – Às vezes o Flamengo é cobrado porque não tem procurado as famílias. A verdade é que as famílias constituíram advogados, e os advogados procuram o Flamengo dizendo “Olha, o contato de vocês tem que ser comigo”. Mesmo assim, a gente continua buscando, nossos psicólogos, eventualmente contato com as famílias. Uma das famílias a gente recebeu aqui em outubro, fizeram visitas no Ninho, foram ao jogo contra o Grêmio. Sempre que existe possibilidade de aproximação, o Flamengo está superaberto a isso. Às vezes essa aproximação é barrada pelos representantes legais dessas famílias, que são os advogados constituídos. Que na grande maioria das vezes têm criado uma barreira para que nós pudéssemos falar diretamente com as famílias.

Fla TV: O Flamengo inicialmente tinha oferecido R$ 5 mil às famílias, mas a Justiça exigiu que fossem pagos R$ 10 mil. Que critérios o Flamengo utilizou para chegar ao valor considerado justo para cada família?

Rodrigo Dunshee – Esse conceito de justiça é muito relativo. Existem técnicas jurídicas, e o Flamengo não está utilizando isso. O Flamengo simplesmente fez a disponibilização de um valor inicial de R$ 5 mil, que era seis vezes acima do que as famílias recebiam através dos meninos. Depois o MP e a Defensoria entraram na Justiça pedindo uma penhora de R$ 57 milhões do Flamengo, e o juiz entendeu que melhor do que essa penhora seria dar R$ 10 mil. O juiz dobrou o valor que o Flamengo estava dando espontaneamente, e essa decisão está valendo. O Flamengo está depositando para as famílias R$ 10 mil por mês.

Fla TV: Existe alguma possibilidade de o Flamengo repensar esses valores? O clube está aberto a negociação?

Rodolfo Landim – Clube esteve sempre aberto a negociação, mas, como já foi bem explicado, depois de muito discutir internamente, nós estabelecemos um teto. Nós estamos dispostos a dentro desse teto discutirmos com as famílias, tentarmos adaptar a cada necessidade específica de família, uma forma de atendê-los dentro daquele teto estabelecido pelo clube.

Fla TV: Existe um prazo para finalizar esses acordos que faltam?

Rodolfo Landim – Impossível dizer (dar prazo para acordo). A gente pode dizer que está aberto para que esses acordos venham a ocorrer. A gente tem demonstrado isso ao longo do tempo, na medida em que, toda vez que a gente consegue equacionar dentro daqueles valores que eu falei, a gente tem tido acordos. Então é muito difícil, porque isso depende não só do Flamengo. Depende das famílias e do tempo delas. Muito difícil estabelecer um prazo. A gente vai estar sempre aberto para fazer esse tipo de acordo.

Fla TV: Alguns familiares consideram que o clube tenta diminuir o futuro que os atletas teriam como uma forma de diminuir o valor das indenizações. Como os senhores tratam essa percepção e aquilo que eles chamam de desprezo por parte do Flamengo?

Rodolfo Landim – A pergunta parte de uma premissa falsa, como se o Flamengo tivesse desprezo, é exatamente o contrário, e que estivesse diminuindo o futuro das vítimas. O que o Flamengo tenta fazer, através de um processo educacional de trazer esse jovem para cá, dar educação esportiva, alimentação e orientação, é criar um futuro para esses jovens, não diminuir o futuro deles. Muitos desses jovens, a gente acredita, que não teriam um futuro tão bom como eles vão passar a poder ter depois de terem passado por aqui. Independente de, no futuro, terem conseguido se tornar profissionais ou não. Mas só a base que o Flamengo acabou oferecendo para esses jovens, eu tenho certeza de que, sendo ou não no futuro atletas, eles vão sair daqui com um futuro muito melhor do que eles teriam se não tivessem vindo para cá.

Reinaldo Belotti – O Flamengo hoje pega esses garotos, quando traz para cá com habilidade de jogar profissional, é lógico, mas ele cuida não só da vida esportiva. Ele forma, além de atletas cidadãos. O Flamengo dá escola, alimentação, acompanhamento psicológico. Parte disso é exigido em legislação, porque o arcabouço do Estado brasileiro entende que um percentual muito pequeno desses garotos vão fazer sucesso como jogador profissional. Então eles têm que estar prontos para enfrentar a vida. Se ali não der certo, tem que dar certo de outra maneira. São essas ferramentas que o Flamengo oferece a eles. Isso está explicitado num recente TAC que nós fizemos com o MP. Nós não usamos estatisticamente nenhum tipo de ferramenta para fazer essa proposta que nós fizemos, porque a estatística não suporta essa proposta. O que nós fizemos foi colocar na mesa alguma coisa que a gente entendia como representativa daquilo que o Flamengo pode dar a essas famílias.

Opinião do colunista:

De esclarecimento não teve nada, o Flamengo fez o vídeo na tentativa de mostrar ao público o que está sendo feito para o pagamento das indenizações às famílias e regulamentações no CT, mas isso pareceu mais um teatro, que não passou confiança alguma, respondendo perguntas que não confrontam o posicionamento do clube em nenhum aspecto.

A torcida, imprensa e principalmente as famílias precisam de respostas concretas, não de um vídeo que reforce posições confusas do clube, posições essas que circulam nos interesses mais confortáveis ao Flamengo.

Em uma coletiva, cara-a-cara com jornalistas, naturalmente os representantes do clube teriam de ser objetivos e concretos em suas afirmações, não possibilitando escapes. Do jeito que foi feito, eles só responderam o que quiseram e isso não é positivo para o clube, que é alvo de perguntas e críticas cotidianamente.

Em certo momento do vídeo, o VP geral e jurídico do clube, Rodrigo Dunschee, diz: “Esse valor não levou em consideração quesitos como a estatística de que esses meninos dificilmente, percentualmente, chegariam a ser titulares do Flamengo”. A frase ficou bastante confusa, fica a impressão que a vida do atleta tem algum valor, e por isso, o mesmo não deveria ser tão alto.

Esse tipo de comentário é bastante preocupante e chega a ser assustador, além de parecer não ter qualquer tipo de empatia com as famílias, ainda dão a entender que as vítimas tinham algum tipo de valor, que é baseado no mínimo, como se o atleta fosse ser dispensado no dia seguinte e não tivesse valor algum para o clube também. Já não é moral colocar valor em uma vida, mas conseguiram piorar: menosprezando o “valor” de cada um. As indenizações são obrigação de um clube, que tinha responsabilidade por menores de idade, e falhou.

No fim, há uma contradição: Reinaldo Belotti diz que não usou estatística alguma para fazer a proposta que fizeram, porque, segundo ele, estatística alguma suporta essa proposta. Fica o questionamento.

Em análise geral, o vídeo é patético. O Flamengo, na tentativa de esclarecer, só deixou mais perguntas e impressões negativas da forma como tratam a situação. Um acordo foi feito com três famílias e meia, em que o valor não é divulgado e, segundo informou a Folha de São Paulo, a diretoria estipulou uma multa de R$ 500 mil para a família que o revelar.

Tudo é muito estranho e obscuro. Para as famílias, só resta a dor.

IMAGEM: ANDRÉ DURÃO

* As opiniões expressadas nesta matéria não refletem o pensamento do site Mercado do Futebol, apenas o olhar individual do colunista que a assinou. *

Aldo Luiz

Narrador esportivo. Amante de futebol, futebol americano, basquete e automobilismo, além de redator de cada um desses esportes. Não existe imparcialidade, mas existe sensatez e profissionalismo para opinar agarrado à fatos e argumentos plausíveis.

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