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Mulher no futebol é resistência: Dia Internacional da Mulher


Mulheres carregam histórias de preconceitos, pouco reconhecimento e muito machismo quando se trata de futebol. Vocês já ouviram falar da maior camisa 10 antes de Marta? 

Sisleide do Amor Lima, mais conhecida como Sissi. Até seu estilo de cabelo era motivo para a antiga camisa 10 sofrer preconceito no mundo do futebol. Uma lenda do futebol feminino que fez parte do grupo de pioneiras da modalidade no país e que, apesar de sua genialidade, despediu-se dos gramados com pouco reconhecimento.

De 1941 a 1979, o futebol feminino era proibido por lei no país: “Meu pai e meu irmão falavam que esse negócio de bola não era para menina. Só me deixavam brincar de bobinha. Um dia acabei me revoltando, peguei minha boneca e arranquei a cabeça. Foi assim que comecei a dar meus primeiros pontapés. Porque futebol feminino era proibido. Foram vários sacrifícios. Mas sempre fui persistente” disse a ex-jogadora.

Sissi nasceu no dia 2 de junho de 1967 e começou jogando futebol na rua, no meio dos garotos, onde desenvolveu sua habilidade com a bola. Aos 14 anos, a ex-camisa 10 deixou sua casa para se profissionalizar.

Sissi apareceu pela primeira vez em 1967, nos jogos olímpicos em Atalanta. Em 1999 a jogadora comandou a equipe nacional na Copa do Mundo de Futebol Feminino, organizada pela FIFA. A equipe ficou em 3° lugar e a ex-camisa 10 conquistou a chuteira de ouro, como artilheira do torneio. 

Aos 53 anos, Sissi trabalha como técnica de um time de base nos Estados Unidos. Lá, Sissi é tratada como uma lenda do futebol feminino. Já o  reconhecimento que recebe no Brasil é inversamente proporcional ao tamanho de seus feitos quando ousou jogar bola e quebrar tabus há mais de três décadas. 

Vamos relembrar os 5 maiores feitos de Sissi na história do futebol feminino: 

1-  1988 torneio experimental da FIFA

Na época, a atacante defendia o Bahia no futebol de campo e salão, e com apenas 21 anos foi convocada para a primeira seleção de futebol feminino do Brasil, onde Sisleide deixou sua primeira marca: marcou um golaço de falta contra a Noruega e começou a escrever sua história na seleção.

2- Sul-americano de 1995

Em 91 Sissi teve uma lesão e não pode participar da primeira copa do mundo feminina. Em 95 ela voltou a competir pelo torneio Sul-americano disputado em Uberlândia-MG. A ex-camisa 10 teve uma atuação perfeita com 100% de aproveitamento e 44 gols em apenas cinco jogos. 

3- Atalanta 1996

A primeira Olimpíada teve um papel importante para a seleção brasileira. A Seleção não conseguiu a medalha, ficando em 4° lugar. 

4- Copa do Mundo de 99

Em 1999 a ex-camisa 10 já estava se consagrando uma das maiores referências do futebol feminino por sua atuação no São Paulo. Na época, a equipe masculina não estava em uma boa fase e sua torcida costumava cantar: “Muricy, põe a Sissi”. Porém, foi pela Copa do Mundo que ela entrou pra história. Neste ano, o Brasil ficou em 3° lugar, mas a camisa 10 foi artilheira ao lado da chinesa Sun Wen, e foi eleita a melhor jogadora mundial. 

5- Lista das melhores jogadoras do século 20

Oito anos após aposentar suas chuteiras, em 2017 Sissi recebeu reconhecimento internacional ao ser eleita a 5° maior jogadora do século XX pela Federação Internacional de História e Estatística do Futebol (IFFHS). 

Na época, seu cabelo curto era motivo de muito preconceito. Sissi com um gesto nobre cortou seu cabelo em homenagem a uma criança com câncer. E mesmo sendo um belo e simples gesto, Sissi até os anos 2000 recebeu muitos ataques. 

“Tive a questão do meu cabelo curto. Chamou a atenção. Na época ninguém sabia porque resolvi raspar a cabeça. Ninguém sabia. Era uma homenagem para uma criança que tinha câncer e sofreu bullying… Mas foi um absurdo no Brasil. Tive que escutar um monte de coisa. O fato de ter cabelo curto todo mundo olhava. Em São Paulo, até não aceitaram que eu participasse de um campeonato. Mas sempre falo para as meninas não deixarem que mudem seus jeitos: ‘Se aceitar do jeito que você é’, declarou a ex-camisa 10. 

Sissi foi uma presença marcante na Seleção Brasileira feminina. Foram suas jogadas que inspiraram as novas gerações do esporte feminino nacional. 

“Até vestir roupa do masculino a gente vestiu. Não tínhamos uniforme. Mas se faria tudo de novo? Faria. A gente lutou bastante. Hoje, essa geração tem mais por causa da nossa luta. Mas não foi fácil ouvir tanto comentário a meu respeito. Só que nada disso me fez desistir”, disse Sissi.

Decidir ser jogadora quando criança foi o primeiro ato de resistência para Sissi. Sua conduta perante os preconceitos e opressões do patriarcado abriu caminho para que muitas outras mulheres pudessem seguir seus sonhos. Sissi tornou-se inspiração para garotas como Cristiane e Marta. Ainda temos um caminho longo e difícil a percorrer, mas assim como Sissi não desistiu e hoje estamos aqui, não vamos desistir para que gerações futuras consigam jogar, treinar, trabalhar no mundo do esporte com o mesmo reconhecimento, valor e espaço que os homens. 

Ser mulher no futebol é ser resistência todos os dias, a todo momento. Lutar contra o patriarcado e mostrar diariamente para a sociedade que nós entendemos sim de futebol como homens, sem precisarmos ser taxadas de “Marias-chuteiras”, ou como forma de agrado aos homens. Nossa paixão é igual e só queremos o mínimo: Respeito.

Foto: FIFA