Em tempos de pandemia, muito se fala sobre corte de gastos nas gestões dos grandes clubes do Brasil. Mas, quanto ao futebol feminino, como clubes que já contam com condições inferiores, em relação às equipes masculinas, têm sobrevivido?
Após receber uma série de denúncias relacionadas aos clubes presentes na Série A2 do Campeonato Brasileiro Feminino, o GloboEsporte.com investigou as situações de todos os 16 clubes da elite do futebol feminino no Brasil, a Série A1.
Inicialmente, vale ressaltar que a CBF repassou R$ 120 mil para cada um dos clubes da primeira divisão do campeonato. Além disso, em um panorama otimista, a Federação Paulista de Futebol, na qual possui oito clubes filiados, está monitorando e auxiliando os clubes durante a paralisação. Até o momento em questão, a federação não recebeu nenhuma denúncia de irregularidades no repasse do dinheiro.
Sudeste
Dez dos 16 clubes do campeonato estão na região sudeste do país, sendo Audax, Corinthians, Ferroviária, São Paulo, São José, Santos, Palmeiras e Ponte Preta do estado de São Paulo.
O Audax teve problemas quanto ao repasse do dinheiro, mas logo foram resolvidos após a própria CBF pressionar a diretoria do clube. Entretanto, Ferroviária (atual campeã brasileira), Palmeiras, Ponte Preta e São Paulo seguem mantendo o pagamento integral do salário das atletas até o momento.
Foto: Felipe Blanco / Ferroviária S/A
Já no Santos, houve corte de 70% dos salários daqueles que recebem mais de R$ 6 mil, o que atinge uma pequena parcela da equipe feminina. No Corinthians, houve redução de 25% no salário em carteira. A equipe feminina tem o salário dividido em 60% de carteira de trabalho e 40% de direito de imagem. Contudo, os direitos de imagem estão atrasados desde abril.
No São José, no mês de março, o salário das atletas foi pago 100% pela Prefeitura. Em abril, o percentual se dividiu em 50% pela prefeitura e os outros 50% com o valor cedido pela CBF. Portanto, o salário integral foi mantido.
Em Minas Gerais, não há atrasos, tampouco cortes, por parte do Cruzeiro. De acordo com o clube, todos os funcionários entraram de férias em março e abril, recebendo normalmente seus respectivos salários e o pagamento das férias será efetuado junto ao 13º, no fim do ano.
O Flamengo possui a equipe feminina em parceria com a Marinha do Brasil, desde 2015. De acordo com o que foi informado pelo clube, algumas atletas são 3º sargento e recebem pela Marinha, enquanto as demais contratadas, recebem normalmente pelo Flamengo.
Foto: CR Flamengo
Sul e Centro-Oeste
Nas regiões centro e sul, a situação está controlada, A dupla Grenal segue mantendo os salários em dia, tal qual o Avaí Kindermann, de Santa Catarina. O Minas Icesp, de Brasília, também manteve os pagamentos. Em todos os casos, não ocorreram atrasos.
Descaso, amadorismo e desvio de verbas
A CBF, diante do repasse de verba aos clubes, não exige contrapartidas, nem condições aos clubes, quanto ao repasse para os dirigentes. O fato ”facilita” o uso da verba em outros setores que não envolvam as atletas.
Alguns clubes estão em situação crítica quanto aos desvios, como o Vitória. As atletas não recebem seus salários, nem ajuda de custos, há pelo menos dois meses. O clube, procurado, não se manifestou sobre o caso. Há relato de uma jogadora do clube – que não quis se identificar – ao Globo Esporte, que revelou problemas até com a alimentação.
OIranduba, do Amazonas, está com atraso nos salários de março e abril. O presidente João Amarildo Pinto Dutra, relatou que os pagamentos dos dois meses em aberto serão feitos até o fim de maio.
Posicionamento Oficial
A CBF se manifestou sobre os casos de desvio através do secretário-geral Walter Feldman, que garantiu investigar clubes que descumprirem as determinações da CBF.
”Quando a CBF, no início da pandemia, repassou aquele recurso era justamente para dar a sustentação aos atletas, para que eles (clubes) pudessem ter um mínimo de condições de, chegando o reinício do campeonato, os plantéis estivessem mantidos. Nós repassamos esses recursos evidentemente com prestações de contas, mas não podemos ter uma ingerência administrativa no clube. Naqueles locais, particularmente em relação ao futebol feminino, que estamos recebendo informações e denúncias de que não foram repassados para as atletas, nós estamos conferindo e solicitando para que isso seja feito. Futebol feminino é prioridade absoluta para nós também”, revelou.
Fato é que a falta de investimento e o descaso com as equipes de futebol feminino, se destacam ainda mais em tempos de crise. É inegável que a pandemia afetou a fonte de renda dos clubes e, consequentemente, cortes de gastos devem ser feitos. Mas em um cenário que a modalidade já é, naturalmente, deixada como segundo plano, espera-se o mínimo em ajuda de custos dos clubes para com as atletas.
Afinal, tratam-se de profissionais do esporte, dignas de reconhecimento, respeito e principalmente apoio financeiro, daqueles que investem milhões (muitas vezes irracionalmente) nas equipes masculinas de futebol. Portanto, se o futebol feminino é, também, uma ”prioridade absoluta”, espera-se que seja tratado como tal.