Futebol Hermano

Cinco anos do Superclássico que não teve fim

Boca Juniors e River Plate é, com toda certeza, o maior clássico sul-americano. São dois times que representam cerca de 70% dos amantes de futebol na Argentina. Juntos, eles têm dez Copas Libertadores e três Sul-Americanas. Há cinco anos, nas oitavas de final da Libertadores tivemos um dos jogos épicos que não chegaram ao fim em La Bombonera. Ali surgia o gigante River de Marcelo Gallardo, que rumava para sua Libertadores.

O Superclássico que nunca acabou ganhou contornos dramáticos três anos depois na Final del Mundo que terminou em Madrid. Confira mais sobre essa final no link abaixo:

Como forma de relembrar do jogo que nunca acabou na Libertadores de 2015, vamos contar mais sobre os antecedentes do jogo, o embate e os efeitos após aquela noite de quinta-feira, 14 de maio.

Campanha perfeita na fase de grupos

O Boca Juniors de 2015 fez a melhor campanha desde a última mudança no formato de classificação da fase de grupos da Libertadores. A equipe do técnoico Rodolfo Arruabarrena fez 18 pontos em 18 possíveis, teve a melhor defesa e o melhor ataque. Desde 2005, quando dois times começaram a se classificar por grupo, somente o Santos em 2007 conseguiu o feito e por ironia do destino, o Boca foi o campeão naquele ano.

O grupo tinha Montevideo Wanderers, do Uruguai, Palestino, do Chile e Zamora, da Venezuela. Boca venceu todos, sendo o líder da fase de grupos e por conta do regulamento à época, pegaria o pior segundo colocado.

O caminho de pedras e tropeços

O River Plate chegou para aquela partida histórica depois de ter passado por dificuldades ao longo do caminho. O clube de Núñez foi, na classificação geral da fase de grupos, o pior colocado, terminando a fase com apenas sete pontos conquistados no fraco grupo 6, que tinha: Tigres, do México, que seria derrotado pelo River na final, Juan Aurich, do Peru, e San José, da Bolívia.

O Millionário só foi vencer e conquistar a classificação na última partida, contra o San José, em Buenos Aires. Entretanto, o clube argentino ainda teve que contar com a ajuda do Tigres, que venceu o Juan Aurich por 5 a 4, no Peru, em uma partida cheia de reviravoltas. O River, último colocado, chegava às oitavas para enfrentar o melhor primeiro colocado: nada mais nada menos que seu maior rival, o Boca Juniors.

Alegria e alívio millonário após a classificação em segundo no grupo (Gabriel Rossi/Getty Images)

O embate

Um dos maiores clássicos do mundo, mas com clubes em momentos opostos vividos na competição. O River, pior colocado na fase de grupos, jogava a primeira partida em casa, no Monumental de Nuñez, contra o seu maior rival, o Boca Juniors. O clube xeneize, por sua vez, teve o melhor ataque, melhor defesa e melhor campanha da primeira fase – e chegava com o benefício de decidir a vaga em sua casa, na temida La Bombonera.

A partida de ida foi longe do esperado. O River comandado por Marcelo Gallardo impôs seu jogo sob forte apoio de mais de 62 mil torcedores. No entanto, o clube local só conseguiu tirar o zero do placar aos 36 minutos da etapa complementar de partida, depois que Marín derrubou Pity Martínez na área e o árbitro Germán Delfino marcou pênalti. Pato Sánchez (hoje no Santos) deslocou Órion e marcou o gol que deu à vitória ao Millionário naquela noite e a vantagem do empate no jogo da volta.

O River na ida abriu uma vantagem mínima. Todavia, a vaga nas quartas de finais ainda estava aberta. Era a temida La Bombonera incendiando os jogadores do Boca para inverterem a vantagem conquistada pelo seu maior rival. A torcida xeneize preparou uma festa com muitas provocações ao arquirrival, todas em alusão ao rebaixamento do clube de Núñez à segunda divisão, ocorrido em 2011.

Drone com o fantasma ‘de la B’ foi uma das grandes provocações na noite de 14 de maio (Alcimar Orfali/Getty Images)

O primeiro tempo foi pegado. O Boca Juniors, comandado por Rodolfo Arruabarrena, tentava dominar o jogo, porém, o River Plate não deixava. 47 minutos se passaram na etapa inicial. Quando os jogadores millionários voltavam ao gramado, após o intervalo, tudo aconteceu. Um torcedor do clube local atingiu, no túnel que dá acesso ao gramado, os jogadores do River Plate. Ponzio, Funes Mori e Vangioni foram os mais atingidos e, além da irritação nos olhos, também ficaram com marcas vermelhas pelo corpo. Após muita espera por parte dos torcedores e conversas dos responsáveis pela partida, a arbitragem decidiu pela suspensão do jogo no intervalo. A decisão final ficaria com a Conmebol.

Leonardo Ponzio foi um dos jogadores do River Plate mais atingidos (Alcimar Orfali/Getty Images)

Punição para o Boca Juniors

O jogo que não terminou no campo foi para julgamento na sede da Confederação Sul-Americana de Futebol, em Luque, no Paraguai. Aquele jogo que havia sido um inferno da torcida do Boca causou a eliminação do Clube.

A decisão foi no sábado, 16 de maio, dois dias após o ocorrido no estádio xeneize. A apreensão era grande. Do lado do River, torcedores queriam a eliminação do rival e do lado do Boca, houve panelaço em La Boca, bairro onde fica La Bombonera. O julgamento começou na manhã do sábado e durou cerca de onze horas. Para muitos torcedores, o time xeneize poderia sofrer uma enorme punição, até mesmo sendo impedido de jogar a Libertadores seguinte. Mas não foi o que aconteceu.

Além da eliminação, o Boca Juniors teve outras sanções. O Tribunal de Disciplina determinou que o hexacampeão da Libertadores jogasse quatro jogos em casa com portões fechados e mais quatro jogos como visitante sem direito a ter ingressos. Medida válida pelas competições da Conmebol. O Clube também teve de pagar uma multa de US$ 200 mil (R$ 1,1 milhão em valores atuais).

Conversa dos jogadores do Boca durante a incerteza sobre o seguimento ou não do jogo (Raul Sifuentes/Getty Images)

Em entrevista ao Globo Esporte à época, Caio Rocha, presidente do Tribunal de Disciplina afirmou: “Trata-se, sem dúvida, de uma decisão emblemática, onde se aplicou severa sanção a um clube de tradição. Os clubes sul-americanos precisam se adaptar a esta nova fase da Conmebol, que desde 2013, com a criação do Tribunal de Disciplina, age com rigor e celeridade no que diz respeito à disciplina e moralidade do futebol. O recado está dado: vandalismo e indisciplina não são bem-vindos na Libertadores”.

Das pedras às taças

Depois daquela partida que nunca terminou, o River parece ter criado novas forças para superar situações adversas. Ainda naquela Libertadores, eliminou o Cruzeiro em pleno Mineirão, deixou o surpreendente Guaraní, do Paraguai, pelo caminho, e venceu o Tigres na finalíssima.

Tudo parece ter se transformado depois da partida sem fim. Com ela, iniciou-se a Era Gallardo, nas mãos deste, o River Plate conquistou a Libertadores em 2015. Todavia, tomou gosto pela coisa, e, nas quatro edições seguintes, foi semifinalista em três, sendo: duas finais – uma com o título sobre o próprio Boca (2018) e uma derrota para o Flamengo (2019); e em 2017, foi eliminado contra o Lanús na semifinal. Além disso, o treinador venceu quase tudo que tinha direito com o River Plate, com exceção ao Mundial de Clubes e a Superliga Argentina.

Comemoração do RIver Plate no seu tricampeonato da Libertadores em 2015 (Gabriel Rossi/Getty Images)

Três Argentinos, mas nenhuma Copa

O Boca Juniors mostrou que era o time dominante no cenário nacional argentino após aquela noite de 14 de maio. A equipe conquistou quatro dos seis Campeonatos Argentinos desde 2015.

Em 2015, a equipe xeneize foi campeã com 64 pontos em 29 jogos. Já o River Plate ficou apenas em sétimo. Em 2016, o Lanús levou a liga. Após a temporada de transição do calendário ‘brasileiro’ para o calendário ‘europeu’, o Boca venceu novamente a liga. Em 30 jogos, foram 18 vitórias e apenas três derrotas. No ano seguinte, o bicampeonato argentino que não acontecia desde 2006, quando o Boca ganhou o Apertura de 2005 e o Clasura de 2006.

Porém, na Libertadores, o time falhou. Em 2016, chegou até a semifinal da Copa e perdeu os dois jogos para o Independiente del Valle, do Equador. Em 2017, ficou ausente.

No ano seguinte, foi até a final de Madrid, em busca de sua sétima taça, mas caiu para o mesmo River Plate de Marcelo Gallardo em um jogo intenso e emocionante na capital espanhola. Em 2019, outra queda para o River Plate, dessa vez na semifinal. O time perdeu o jogo de ida no Monumental de Núñez por 2 a 0 e somente fez uma vitória simples em casa.

Contra o Independiente Del Valle, o Boca Juniors perdeu os dois jogos da semifinal de 2016 (Marco Endelli/Getty Images)

Final del Mundo

O reencontro estava marcado. A possível continuação daquela partida que nunca terminou. Perdão torcedores, foi remarcado. Em 2018, o destino faria com que Boca Juniors e River Plate voltassem a se enfrentar em uma edição de Copa Libertadores, contudo, desta vez, em uma final – a Final do Mundo

Desta vez, a partida de ida foi disputada na Bombonera, casa do Boca Juniors. A partida terminou empatada em 2 a 2 e tudo ficaria para ser decidido no Monumental… ou não. Na chegada da delegação xeneize ao estádio, o ônibus foi atingido por objetos dos mais variados tipos e, posteriormente, os estilhaços dos vidros atingiram os jogadores. Depois de muita confusão, a partida foi remarcada para… Madrid!

Em 2015, o River Plate, mesmo com a pior campanha, decidiu em casa contra o Tigres, já que, segundo regulamento elaborado pela Conmebol, a partida final teria que ser disputada na América do Sul. No entanto, desta vez, a partida foi transferida para Madrid. Incoerências da Conmebol. Naquela noite, na capital da Espanha, o River venceu o Boca por 3 a 1 na prorrogação e conquistou mais uma Libertadores na Era Gallardo. Mais um capítulo extraordinário na rivalidade gigantesca do Superclássico.

O troco veio

Mesmo que o River Plate tenha vencido duas Libertadores após o embate de 2015 e tenha chegado em outra final, na trajetória do treinador Marcelo Gallardo falta a Superliga Argentina. Em mais uma ironia do destino, os millonários tiveram a taça até a última rodada da liga encerrada em 2020.

Apesar da imensa campanha do River Plate, o Boca conseguiu ser um time sólido durante todo o campeonato. Foram somente oito gols sofridos em 23 partidas. Nas três últimas rodadas, jogos dramáticos.

O River Plate precisava vencer dois dos três jogos para ser campeão sem depender de tropeço do Boca. Já o time de La Boca tinha de vencer os três que restavam e contar com os vacilos millonarios. E eles vieram.

Na 21ª rodada, o River venceu o Estudiantes de La Plata fora de casa por 2 a 0. O Boca fez 3 a 0 no Godoy Cruz na Bombonera. Na 22ª rodada, o River empatou com o Defensa y Justicia em Núñez. O Boca venceu o Colon em Santa Fé.

Mesmo assim, o River precisava apenas vencer e seria campeão. Era o título que faltava para coroar esses cinco anos de vitórias. Não veio. Os Millonários empataram com o Atlético Tucumán fora de casa e Tevéz fez o tento do título em Buenos Aires para o Boca Juniors sobre o Gimnasia de Maradona. Foi o troco da Final del Mundo de Madrid. Desespero para os de River e glória para os de Boca.

A euforia da torcida xeneize após o gol do título da Superliga Argentina 2019-2020 feito por Tévez (MarcosBrindicci/Getty Images)

Foto da capa: AFP.

Este texto foi produzido por Gabriel Neri e Vinícius França. Somos dois dos milhões de amantes da Copa Libertadores da América e de suas histórias. Muito obrigado pela leitura!

Gabriel Neri

Amante de uma boa retranca uruguaia enquanto escuto uma MPB tomando uma cerveja argentina. Valorize o nosso.

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