Foram dez dias de intervalo entre o jogo do Criciúma e o do Bahia e os sentimentos do torcedor coral se misturavam entre desconfiança e esperança. Desconfiança, porque os jogos que o Santa fazia fora não convenciam nem os mais otimistas, e esperança, porque o torcedor coral tem na sua essência a virtude de sempre acreditar, mesmo que os números e as circunstâncias digam o contrário.
Pela manhã ao sintonizar as rádios para escutar como estava o clima em Salvador, um dos repórteres locais entrevistou um torcedor do Santa que embarcava para Salvador e o indagou sobre qual seria sua expectativa para o maior Clássico Nordestino. Objetivo, o rapaz respondeu: “Juntei mil reais para pagar a passagem. Eu estou fazendo esse sacrifício e o que espero é que os caras deem sangue lá dentro”.
Ao ouvir as palavras do torcedor entrevistado, me coloquei no lugar dos jogadores. Se eu ouvisse aquele torcedor, que juntou suas economias e pediu em troca apenas raça e vontade de ganhar, entraria com o sangue nos olhos e daria tudo de mim.
Acho improvável que algum jogador tenha escutado aquela entrevista na concentração, mas acredito que aquele sentimento tenha sido transmitido aos jogadores, que nem de longe lembraram o Santa Cruz apático e burocrático de outras jornadas longe do Arruda.
O Mais Querido contrariou as previsões da imprensa, as estatísticas dos matemáticos e encheu de esperança sua imensa torcida, que esperava uma partida dessas pra descer dos Morros e lotar as Repúblicas independentes do Arruda.
RESENHA DO JOGO
Logo nos primeiros minutos de jogo se pode observar que a entrada de Bileu na contenção modificaria completamente o esquema do Santa Cruz. Com mais pegada no meio-campo, o Tricolor Pernambucano dominou as ações e ditou o ritmo do jogo envolvendo o time Baiano que pressionado pelo bom público na Fonte Nova se surpreendeu com o bom toque de bola do meio-campo coral.
Com boa infiltração dos laterais, a primeira grande chance do Santa Cruz apareceu nos pés de João Paulo, que após receber um bom passe de Luizinho, chutou fraco para a defesa de Douglas Pires.
A chance mais clara de gol do Santa Cruz também foi protagonizada por Luizinho, quando Lelê, ao cair pela ponta esquerda, viu Grafite livre na grande área. O atacante foi travado pelo Zagueiro Gustavo e a bola sobrou livre pra Luizinho que sozinho chutou a bola pra fora.
Já o time baiano pressionava de maneira desordenada e teve seu único lance de perigo no primeiro tempo quando, numa marcação de falta bastante duvidosa, Souza cobrou fechado, a bola tomou uma curva inesperada e o Paredão Coral fez mais uma de suas defesas memoráveis, evitando assim o primeiro tento do tricolor de aço.
Ficou no sentimento do torcedor coral que o primeiro tempo poderia ter sido muito melhor pelas chances desperdiçadas pelos atacantes.
Na etapa complementar, nenhum dos treinadores mexeu nos times e a partida não mudou. O Santa Cruz dominava as ações quando, num lance de pura infelicidade e boa vontade do homem do apito, a bola bateu na mão de Vitor e foi marcada a penalidade máxima. Em seguida, Souza, que dificilmente perde penalidades, chutou na trave e Alemão mandou para escanteio.
Parecia que naquele momento o Santa Cruz redobraria sua atenção, ficaria com mais moral e partiria pra cima para resolver de vez o jogo. Com uma penalidade perdida aos cinco minutos de segundo tempo em plena decisão, o time da casa se abate e demora para se recuperar. Certo?
Não! Estamos falando de Santa Cruz!
Logo em seguida a penalidade perdida, o Bahia cobrou escanteio e Kieza, após uma cabeçada do Zagueiro e uma defesa espetacular de Tiago Cardoso, apenas teve o trabalho de empurrar para o fundo das redes e abrir o placar para o Bahia.
Naquele momento, acredito que muitos torcedores jogaram a toalha por ser recordar de outros bons jogos feitos pelo Santa e pelos placares negativos que foram amargurados ao final.
Mas dessa vez foi muito diferente.
O Time de Guerreiros pareceu não se abater com o gol sofrido, com a Fonte Nova lotada e com a empolgação da torcida Baiana, e continuou impondo o mesmo ritmo do primeiro tempo.
Após cobrança de escanteio de João Paulo, o criticado Dany Morais subiu e de cabeça estufou as redes Baianas, calando os mais de 30 mil torcedores presentes.
Jogando no desespero, o Bahia se atirou para cima e o Santa Cruz mostrou frieza e soube se aproveitar da situação.
Bileu, em uma tarde inspirada, arrancou da intermediária coral e tocou para João Paulo que se livrou do Zagueiro, cruzou para Luizinho desviar a bola que sobrou pra Bruno Moraes, livre, ter a frieza de escolher o canto e decretar a vitória do tricolor do Arruda e incendiar de uma vez a massa coral.
Foi a vitória da superação e da raça!
ATUAÇÕES
Tiago Cardoso: Não teve culpa no gol e fez duas defesas de pagar ingresso.
Vítor: No primeiro tempo, apoiou muito e proporcionou subidas do Bahia pelo seu lado. Fez um bom jogo no segundo tempo.
Danny Morais: Pareceu motivado pelas críticas que recebeu da imprensa Baiana. Entrou concentrado e fez o gol.
Alemão: Ganhou todas de Kieza e nem parecia o jogador de outras partidas que levava cartão desnecessário.
Allan Vieira: Falta qualidade em algumas situações, mas sobra disposição e vontade. Joga no meu time por isso.
Wellington César: Cão de guarda coral. Discreto e imprescindível.
Bileu: Resgatou o bom futebol de 2014. Deu equilíbrio ao meio-campo e distribuiu bem as jogadas. Foi um dos melhores em campo.
João Paulo: Primeiro tempo discreto. Já no segundo, mostrou a raça e a técnica de sempre. O barbudo é fundamental.
Lelê: Tem suas limitações, mas se sobressai pela sua entrega ao time. Reclamou ao sair, mas interpretei mais como vontade de ajudar do que indisciplina.
Luizinho: Válvula de escape do Santa Cruz. Perdeu um gol feito no primeiro tempo. No segundo ajudou e participou do gol de empate.
Grafite: Visivelmente sem ritmo, fez o pivô em algumas jogadas e jogou para o time. Acho injusta as críticas que muitos torcedores fizeram. Ele será muito útil nessa reta final.
Raniel: Levou um “carão” antes mesmo de entrar, quando Martelotte mandou chamá-lo e ele não viu. Entrou no jogo desligado e não rendeu como nas partidas anteriores.
Bruno Moraes: Entrou, resolveu a parada e homenageou todo-duro. Mostrou que tem faro de gol e caiu nas graças da torcida.
Néris: Entrou no final e não dá para avaliar.
Marcelo Martelotte: Mudou o esquema no principal jogo da série B e acertou. Consegue tirar o melhor de cada atleta e faz o time jogar bonito. Pareceu centrado nas entrevistas pós-jogo ao dizer que o Campeonato só acaba no dia 28 de novembro.